sexta-feira, março 09, 2007

Super Size Me

Morgan Spurlock, impulsionado pelo movimento de cinema independente que veio à tona com o sucesso de bilheteria de Michael Moore, documenta a cultura norte-americana do fast food e os efeitos físicos e mentais que ele provoca. O diretor passou trinta dias a base de hambúrgueres, batata frita e refrigerante. Ingerindo cinco mil calorias diárias, ele foi sua própria cobaia no combate à rede McDonald´s. O experimento rendeu a Morgan onze quilos, além de problemas psicológicos e de saúde, que foram monitorados por três médicos antes, durante e depois do processo. Apesar dos indesejados problemas adquiridos, o diretor conquistou o posto de quarto documentário mais visto da história do cinema, além de provocar mudanças na maior rede mundial de fast foods, que aboliu o tamanho super size (gigante) e passou a imprimir os valores nutricionais dos lanches.

O espectador é constantemente surpreendido com a análise de Spurlock do procedimento de marketing e vendas da indústria alimentícia, que trabalha para deixar o consumidor acomodado e passivo. Começa na infância. As crianças são seduzidas através dos brinquedos que vêm nos lanches, do playground com piscina de bolinhas, das canções infantis, e também do desenho animado da turma do Ronald, que passa na TV. Com os pais não é diferente, são atraídos pela praticidade e comodidade que esse tipo de restaurante oferece, além de terem os filhos entretidos com os brinquedos e supervisionados pelos funcionários. A má alimentação está presente igualmente nas escolas, que oferecem cardápio rico em calorias e gorduras, colaborando para um futuro de diabetes, obesidade e alto colesterol de milhares de jovens. E é devido aos maus hábitos alimentares, que já são costume antigo do cidadão norte-americano, que os Estados Unidos são o país com o maior numero de obesos do mundo.

O grande sucesso de "Super Size Me" gerou polêmica e abalou a maior rede mundial de fast food, rendendo a Michael Moore, outro grande especialista desse estilo sarcástico de documentário, 45 milhões de dólares. Ele, que ficou reconhecido em todo o mundo por criticar o american way of life, é hoje o garoto-propaganda do McDonald´s. Pagando esse obeso cachê, a empresa fechou contrato com o cineasta por dois anos, com o objetivo de contra-atacar a má publicidade que vem sofrendo desde o lançamento do filme. Não é à toa que a companhia quer limpar sua reputação: o filme foi indicado ao Oscar de Melhor Documentário e Morgan Spurlock ganhou o prêmio de Melhor Diretor de Documentário no Sundance Film Festival.

(Márcia Pavese, para o Cinestese)

quarta-feira, março 07, 2007

Uma Verdade Inconveniente

Um novo relatório, que será publicado no mês que vem, diz que os efeitos da mudança climática serão ainda mais graves do que os que as Nações Unidas tinham previsto. O diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), Achim Steiner, assegurou que “as conseqüências da mudança climática são mais sérias do que achávamos até agora”. Notícias como esta tornam cada vez mais necessária a tomada de consciência por parte dos habitantes do planeta Terra, se quiserem passar mais algum tempo por aqui e legar a seus filhos um mundo minimante habitável (já que todas as projeções apontam para uma situação crítica em, no máximo, 50 anos). E é aí que entram produções como o documentário premiado (Oscar de Melhor Documentário em 2007) do ex-vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore, “Uma Verdade Inconveniente”.

Dirigido por Davis Guggenheim, o filme, que chegou às locadoras no mês passado, apresenta argumentos persuasivos de Gore, ilustrados com gráficos, tabelas e belas imagens de várias partes da Terra. Gore explica que já não se pode tratar o aquecimento global como um problema meramente político, mas sim como o maior desafio que se enfrentará neste século.

O filme é muito bem feito, recheado de dados científicos, mas sem ser técnico demais. A criatividade e o bom humor recheiam a produção e a qualidade retórica de Gore fica evidente. O filme apenas peca pelo excessivo personalismo, centrado que é na figura do político que quase se tornou presidente nas eleições do ano 2000 e que perdeu para o Bush que não quis assinar o Protocolo de Kioto.

No fim do filme, são dadas sugestões de atitudes individuais para combater o efeito estufa.

A verdade que o filme apresenta pode ser “inconveniente” para quem pensa em viver aqui para sempre. Mas quando lembramos que o aquecimento global traz a reboque problemas como a fome, epidemias e inundações, é impossível deixar de relacionar isso com outra verdade profetizada há muitos séculos, na Bíblia: a verdade da volta de Jesus. Mas a diferença, entre tantas, é que esta traz esperança.

Michelson Borges

domingo, março 04, 2007

Orgulho e Preconceito

O grande problema de um roteirista ao adaptar um livro para o cinema, seja ele qual for, é conseguir captar todas as nuances que o escritor deu ao seu trabalho na transposição. Justamente na forma como o roteiro de "Orgulho e Preconceito" foi tratado que reside o seu maior defeito: falta-lhe a ironia fina, a sagaz observação aos padrões da época que permeia cada entrelinha dos escritos de Jane Austen.

Austen (1775-1817), nascida em Hampshire, Inglaterra, foi a filha caçula de oito irmãos de uma família tradicional. Escreveu, aos quinze anos de idade, seu primeiro romance, Amor e Amizade, e em 1796 deu cabo a Primeiras Impressões, que acabou sendo recusado por um editor. Austen então o reescreveu totalmente, e o rebatizou de Orgulho e Preconceito, sendo este lançado somente em 1813, e que acabou se tornando seu romance mais famoso.

Orgulho e Preconceito, assim como as demais obras de Austen, acabou recebendo várias adaptações para o cinema. Greer Garson e Laurence Olivier, em 1940, já travavam as batalhas intelectuais do romance. Em 1995, foi a vez de Jennifer Ehle e Colin Firth, em uma aclamada minissérie feita para a televisão britânica. Dessa vez, os papéis principais ficaram com a irradiante Keira Knightley e o soberbo Matthew Macfadyen.

A história do filme (ou do livro, como preferir) se centra na tradicional família Bennet, onde Sr. (Donald Sutherland, em notável atuação) e Sra. Bennet (Brenda Blethyn, escorregando de vez em quando) estão às voltas com o alvoroço que um recém-vizinho rico, Sr. Bingley (Simon Woods), tem causado em suas cinco filhas, principalmente em Jane (Rosamund Pike), que enxerga nele o casamento dos seus sonhos. Naquela época, o enlace matrimonial era coisa séria: não casar significaria à pobre moça o estigma de solteirona, perdedora e infeliz. Portanto, não casar não era uma atitude feminista, simplesmente não era adequado à época.

Elizabeth Bennet (Knightley) é uma moça à frente do seu tempo. Não tão bonita quanto a sua irmã e de uma sagacidade e inteligência superior, ela enxerga com outros olhos a vida e o seu destino. Mas acaba envolvida com o melhor amigo do Sr. Bingley, o aristocrata e pedante Sr. Darcy (Macfadyen). Inicialmente, como em toda história de amor que se preze, eles não se bicam: ela, por achá-lo soberbo; ele, por desprezar a condição social dela. Depois, ele acaba por se apaixonar por ela e, mesmo amarrado aos preceitos da época, se declara, mas é rejeitado. Até que enfim acertam os ponteiros.

É uma história de amor, sim, e das mais belas, mas o que falta ao filme é exatamente um olhar mais satírico por parte da roteirista estreante em cinema Deborah Moggach. Tanto é que o filme muitas vezes percorre a perigosa linha do "filme açucarado de mulherzinha". Mas há de elogiar o roteiro em uma questão: há diálogos inteiros do livro fielmente transpostos, algo rarísismo de se ver hoje em dia, o que prova que a roteirista manteve, acima de tudo, o respeito pela obra em questão.

O diretor Joe Wright, egresso da tevê e também estreante na tela grande, faz um trabalho bastante acadêmico, bem quadradinho. Pausado, não tem pressa em construir seus personagens e consegue envolver o espectador – e nesse ponto ajuda, e muito, a climática e solar trilha de Dario Marianelli. Em certo momento, a câmera de Wright passeia por cômodos mostrando vários personagens, em um belo momento de arrojo. Deve ter deixado James Ivory morrendo de inveja.

(Por Andy Malafaya, no site Cineplayers)

Nota: Para quem gosta do gênero, é um belo romance sem cenas reprováveis (coisa rara). É apropriado para discussão de valores e para comparações com os padrões morais de nossos dias e os comportamentos associados ao namoro e casamento. Um pouco do respeito que se dava à instituição na época (sem exageros, é claro) seria bom resgatar.