quarta-feira, novembro 01, 2006

Vôo 93

Faz mais de cinco anos, mas as cenas não saem da memória. Muitas pessoas são capazes de dizer o que estavam fazendo no momento em que um dos maiores atentados terroristas da história acontecia nos Estados Unidos. Em questão de minutos, dois grandes símbolos da América – as Torres Gêmeas do World Trade Center e o Pentágono – foram atingidos por aviões comerciais dominados por terroristas islâmicos.

O plano terrorista era causar estrago com quatro Boeings, mas um deles atrasou a decolagem e a tripulação e os passageiros acabaram sabendo o que estava acontecendo. “Vôo 93” (Estados Unidos, 2006), dirigido por Peter Markle, é um drama envolvente e tenso do começo ao fim. Os eventos e diálogos foram reconstituídos a partir de horas de entrevista com controladores de vôo, militares e com as famílias dos 40 passageiros e tripulantes que estavam a bordo do Boeing 757 da United Airlines. Essas entrevistas, juntamente com as gravações de vôo e outras informações se tornaram a base do filme que quase poderia ser considerado documentário.

Um grupo de atores talentosos, mas pouco conhecidos, interpreta as pessoas comuns que embarcaram para a morte naquele fatídico 11 de setembro. A decisão de tomar o avião dos terroristas, a fim de que não destruíssem a Casa Branca, os telefonemas de despedida para os parentes e os últimos instantes antes da queda; tudo é contado em cenas e diálogos carregados de muita emoção.

É um filme que faz pensar na fugacidade e fragilidade da vida, e em como certas coisas como carreira, dinheiro e sucesso se tornam tão pequenos em face da morte. No fim das contas, o que realmente importa são os relacionamentos, as pessoas a quem se ama, a família.

Especialmente tocante é o momento em que um dos passageiros pede a uma atendente da companhia aérea que ore com ele ao telefone. Em situações extremas, quase todo ser humano percebe sua finitude e se volta para Deus.

Michelson Borges

terça-feira, outubro 17, 2006

Irmão Sol, Irmã Lua

Francisco nasceu por volta de 1182, na cidadela italiana de Assis. Filho de comerciantes de tecidos, ele poderia ter sido um próspero burguês. Mas não. Em certo momento da vida, aos 26 ou 27 anos de idade, o jovem optou pela pobreza, pelo pacifismo e pela caridade.

Conforme a Revista das Religiões de outubro de 2004, “ao contrário de seus contemporâneos, [Francisco] não desvinculou a fé da realidade cotidiana. Pelo contrário. Em cada rosto, encontrava o próprio Cristo. Em qualquer manifestação da natureza – dos astros aos animais e às plantas – enxergava o carinho de Deus. Foi um homem de seu tempo, mas não se prendeu a ele. E, por isso, foi considerado santo: São Francisco de Assis”.

Conta-se que Francisco teria percorrido o mundo para pregar o amor ao próximo. Em 1219, teria ido ao Egito para conversar com o sultão Melekel Kamel e lhe propor a paz, numa época em que cristãos e muçulmanos guerreavam por Jerusalém.

Sobre sua conversão, Francisco escreveu em Testamento, um dos poucos escritos que deixou: “Quando ainda estava em pecado, parecia muito amargo ver os leprosos, mas o próprio Senhor me levou a estar com eles e eu usei de misericórdia: quando me afastei dali, aquilo que me parecia amargo rapidamente transformou-se em doçura de alma e de corpo. Em seguida, esperei um pouco e saí do mundo.”

Era realmente um homem especial. Segundo vários livros, Francisco andava com cuidado para não pisar em nenhum inseto ou planta. Passava sobre as pedras com reverência e afastava, carinhosamente, lesmas e formigas do caminho – para que ninguém, sem querer, as machucasse.

Segundo o teólogo Inácio Strieder, da Universidade Federal de Pernambuco, o franciscanismo (que depois viria a se tornar ordem religiosa) “foi um movimento pelo amor e pela paz, que colocava em prática o evangelho como jamais a Igreja o fizera após Jesus Cristo”. De fato, a vida e as atitudes simples de Francisco contrastavam com a opulência de Roma e eram-lhe uma viva reprovação.

No filme “Irmão Sol, Irmã Lua” (Itália, 1972), dirigido por Franco Zeffirelli, é apresentada a história de Francisco de Assis. O filme focaliza os primeiros anos da vida do jovem - numa época de obscurantismo e falta de genuíno amor - e mostra a surpreendente experiência que transformou Francisco num exemplo de cristão para o mundo. Um mundo que hoje, mais do que nunca, carece de Franciscos e Franciscas.

Michelson Borges

domingo, outubro 15, 2006

Resgate Abaixo de Zero

Da região mais inóspita, selvagem e fria do planeta – e inspirada em uma surpreendente história real – vem a emocionante história de ação e aventura, de cachorros e homens, de amizade e lealdade e do comovente espírito de tenacidade e esperança que deflagraram uma das mais incríveis histórias de sobrevivência de todos os tempos. Tendo como pano de fundo a gelada e tempestuosa Antártica, "Resgate Abaixo de Zero" (Eight Below, 2006) acompanha oito surpreendentes heróis em apuros no fim do mundo e o homem que seria capaz de fazer de tudo para trazer seus verdadeiros amigos de volta para casa.

O inclemente inverno da Antártica está apenas começando quando uma intrépida equipe de exploradores e cientistas em uma missão de pesquisa – o guia de sobrevivência Jerry Shepard (Paul Walker), seu melhor amigo e cartógrafo Cooper (Jason Biggs) e o ríspido geólogo Davis (Bruce Greenwood) – escapam por pouco de um acidente fatal graças à inabalável equipe de oito habilidosos cães de trenó.

Forçados a deixar o local, os homens têm que abandonar os adorados cães na região congelada – com a promessa de retornar. Mas quando a tempestade do século se aproxima, impossibilitando todo e qualquer tipo de resgate, os cães ficam presos. Agora, enquanto os corajosos e inteligentes cães – incluindo Maya, a nobre líder da matilha; o rebelde e inquieto Shorty; e Max, o jovem trainee em ascensão – lutam para sobreviver ao inverno mais rigoroso do planeta, o inconsolável Jerry está determinado a organizar uma missão para um resgate aparentemente impossível, auxiliado pela bela e aventureira piloto especializada em baixa altitude Katie (Moon Bloodgood). Unidos apenas por firmes laços de amizade, tanto humanos como cães empreendem uma notável jornada de resistência, perseverança e determinação para se reencontrarem nessa espetacular, porém perigosa, região.

Baseado em fatos reais, é um filme para se ver em família.

(Do site Cinemacomrapadura)

quinta-feira, agosto 24, 2006

O Náufrago

Chuck Noland (Tom Hanks) é um inspetor da Federal Express (FedEx), multinacional encarregada de enviar cargas e correspondências, que tem por função checar vários escritórios da empresa pelo planeta. Porém, em uma de suas costumeiras viagens ocorre um acidente, que o deixa preso em uma ilha completamente deserta por quatro anos. Com sua noiva (Helen Hunt) e seus amigos imaginando que ele morrera no acidente, Chuck precisa lutar para sobreviver, tanto fisicamente quanto emocionalmente, a fim de que um dia consiga retornar à civilização.

(Movieguide)

Nota: Como puro entretenimento, é um filme interessante.
Não deixe de ler o texto “A esperança dos náufragos”, no blog www.michelsonborges.com

Na avaliação de Erick Pessoa (no Movieguide):

“Por incrível que pareça, o filme não perde a qualidade de narração no segundo ato, onde o personagem de Hanks ‘divide’ a cena apenas com seu amigo imaginário Wilson - materializado em uma bola de vôlei; muito pelo contrário, seu problema está exatamente no início e na parte final da trama. Aliás ‘Naufrago’ é um exemplo concreto de que não existe fórmula para um bom roteiro; primeiro porque consegue inserir o problema central nos primeiros 30 minutos de filme, mas em detrimento de uma filmagem acelerada no primeiro ato, fazendo com que a vida de Noland pareça um inferno e quase nos faz acreditar que se ele não fosse parar naquela ilha, provavelmente, teria um enfarte. O único problema é que a ilha em si é extremamente inóspita e essa hostilidade do ambiente é que nos envolve para torcer para que Noland volte para a ‘civilização’. Ou seja, o começo turbulento comprometeu completamente a primeira parte e como se não bastasse William Broyles Jr. opta por um desfecho convencional, pouco criativo e decepcionante. A grande compensação está na parte central do filme que é excelente. A interpretação de Tom Hanks é um show e o ator consegue cativar a atenção do espectador com facilidade.

Durante o desenrolar das desventuras de Noland, vemos um homem regido ao extremo pela doutrina de ‘tempos e movimentos’, preso em uma ilha, absolutamente impotente em relação aos compromissos, em um local esquecido pelo cronômetro. O elo entre Noland e a hora marcada, passa a ser simbolizado pelo relógio de bolso, presente de sua namorada (Helen Hunt), mas que teve a sua importância transferida dos ponteiros para a capa do mostrador, onde se encontra o retrato da moça. E nessa transição da atenção é que Noland percebe o que era realmente importante e o relógio passa a ser nada mais do que um porta-retrato. Simplesmente uma moldura para que ele admire o rosto de Kelly.

“Vivendo uma situação tão adversa, Noland projeta seu amigo imaginário na bola de vôlei Wilson, um ‘personagem’ inventado para ser a ‘válvula de escape’ dos pensamentos do protagonista e desta maneira dispensando não só a locução em off como o narrador (o que foi uma ótima percepção do roteirista). No entanto, o talento de Hanks extrapolou a si próprio e não só deu vida para Wilson, como fez com que o público, despercebidamente, estabelecesse uma afinidade com o ‘objeto’. [...]

“Vale a pena mencionar o grande esforço de Hanks que perdeu 30 quilos para conferir veracidade ao seu personagem. Um feito que certamente ajudou a produção a receber duas indicações ao Oscar, nas categorias de Melhor Ator (Tom Hanks) e Melhor Som, além de ganhar um Globo de Ouro, na categoria de Melhor Ator em Drama (Tom Hanks).”

segunda-feira, agosto 21, 2006

O Quarto Sábio

Com Martin Shenn, Alan Arkin, Eillen Bennan e direção de Michael Ray Rhodes, "O Quarto Sábio" conta a história de um homem sábio em busca do verdadeiro sentido da vida. Filho de um rei da antiga Pérsia, o sábio procura nas Sagradas Escrituras o significado real da vida e descobre as profecias sobre Jesus, o Rei dos reis. O plano dele é encontrar-se com os três reis magos no deserto para irem ao encontro do Rei Jesus. Mas, depois de uma série de percalços, o sábio somente consegue encontrar Jesus no fim de sua vida. E encontra também a resposta que procurava.

Baseado no clássico de Henry Van Dyke, o filme (apesar de ser ficção) é realmente emocionante.

Michelson

quinta-feira, agosto 10, 2006

A Carne é Fraca (documentário)

Você ainda é carnívoro? Não conhece a grande realidade da industria bovina e da granja? Este é o filme certo. Este documentário feito pelo Instituto Nina Rosa, uma ONG sem fins lucrativos, foi indicado para o Festival Internacional de Cinema Ambiental.

“Alguma vez você já pensou sobre a trajetória de um bife antes de chegar ao seu prato? Nós pesquisamos isso para você e contamos neste documentário aquilo que não é divulgado. Saiba dos impactos que esse ato – aparentemente banal – de consumir carne representa para a sua saúde, para os animais e para o Planeta.” – Sinopse feita pelos produtores.

O documentário conta com depoimentos dos jornalistas Washigton Novaes e Dagomir Marquezi, entre outros, como pesquisadores universitários.

É surpreendente, 80 por cento das pessoas que assistem ao filme nunca mais agem da mesma forma ao comer carne, sempre com um peso na consciência, e muitos, muitos mesmo, passaram a se tornar vegetarianos após ver esse filme, pois ele “abre os olhos”.

O filme apresenta algumas cenas fortes sobre o processo industrial da granja, do abate dos bovinos, entre outros animais. Algumas cenas são marcantes, como o abate dos bois; como tratam as galinhas, o famoso babybife, a “escolha” dos pintinhos. Porém, necessárias, pois esta é a intenção: causar impacto nas pessoas, pois de certa forma, infelizmente, a maioria hoje só toma uma atitude depois de um impacto muito grande.

Recomendo para todos. As crianças podem ficar um pouco traumatizadas, mas também poderão deixar de comer carne pelo resto de suas vidas, e passarão a ter mais compaixão pelos animais, e repudiar a morte e a desumanidade.

(Evandro)

segunda-feira, agosto 07, 2006

O Óleo de Lorenzo

Em 1984, um médico diagnostifica em um garoto uma doença rara, dando-lhe no máximo mais dois anos de vida. Inconformados com essa situação, os pais passam então a pesquisar sobre a doença, a fim de encontrar algo que possa ajudar o filho. Dirigido por George Miller (Mad Max) e com Nick Nolte, Susan Sarandon e Peter Ustinov no elenco, o filme recebeu duas indicações ao Oscar.

Baseado em história verídica, "O Óleo de Lorenzo" é um filme emocionante por tratar com seriedade um tema polêmico: até onde devemos nos submeter a um tratamento médico quando este não apresenta cura para uma doença? Aqui, o papel da medicina foi substituído pela dedicação dos pais de Lorenzo Odone (muito bem interpretados pelos sempre competentes Nick Nolte e Susan Sarandon), que lutaram para descobrir o único tratamento realmente eficaz contra a ALD, enquanto os ditos cientistas se preocupavam muito mais com questões financeiras relacionadas com seus hospitais e suas carreiras.

Como se não bastasse o forte contexto em que está inserido, o filme ainda conta com a boa direção de George Miller, que valoriza ainda mais a narrativa da história.

(Marcos Ribeiro)

quinta-feira, junho 15, 2006

Homens de Honra

Promessas de filho para pai, persistência, honra e glória. Temas recorrentes na literatura e no cinema. De tempos em tempos, porém, alguém requenta os velhos clichês de maneira eficiente, já que uma lição de vida não faz mal a ninguém. Baseado na história real de Carl Brashear, "Homens de Honra" (EUA, 2000) mostra o velho embate entre o recruta e o oficial na Marinha, mas fica degraus acima de seus similares, em boa parte graças às interpretações na medida de Robert DeNiro e Cuba Gooding Jr.

Situada nos anos 40, a história mostra as esperanças de Carl (Gooding), filho de um lavrador humilde, em ser alguém na Marinha. Porém, ao chegar no navio, descobre que os negros são recrutados somente para trabalhar na cozinha. Banhos de mar, para os oficiais "de cor", somente às segundas-feiras. Eis que Carl, um belo dia, resolve tomar banho fora do horário determinado e mostrar aos superiores seus dotes como nadador. Após ser preso, consegue, com a ajuda do capitão Pullman (Powers Boothe), uma vaga como marinheiro salva-vidas.

Seu sonho, porém, é ser mergulhador da Marinha. Após dois anos de tentativas, consegue chegar à obscura escola de mergulho, comandada por Leslie Sunday (DeNiro). Lá, seguem-se as cenas de praxe, entre elas a que todos os outros recrutas deixam o alojamento no momento em que Carl entra. Claro que sobra para ele um amigo, o tímido e gago Snowhill (Michael Rapaport). Não há dúvida de que o filme mostra Carl como a pessoa mais perfeita e determinada do mundo, além do melhor mergulhador que a Marinha americana já teve...

Uma curiosidade no elenco é a presença de Charlize Theron, uma das jovens atrizes de maior prestígio no cinema atual. Charlize tem uma pequena participação, como a jovem esposa de Robert DeNiro. Mas suas cenas não são lá essas coisas.

Nunca se sabe, em filmes baseados em história real, o quanto há de verdade. Mas o preconceito não é atenuado pelo diretor George Tillman Jr., que, aliás, também é negro. Este é o segundo filme do cineasta, que estreou com o igualmente melodramático "Sempre aos Domingos", que enfoca a tradição do almoço dominical de uma família afro-americana.

Apesar de "formulaico" e longo demais, o roteiro acerta em cheio no desfecho, que, claro, ocorre em um tribunal militar. Após perder uma perna em acidente, Carl é obrigado a andar com uma roupa de mergulho com mais de 100 quilos para provar que ainda é capaz de continuar na profissão. E você pensava que sua vida era um calvário...

(Terra Cinema)

quarta-feira, maio 31, 2006

A Sombra e a Escuridão

Dirigido pelo competente Stephen Hopkins, "A Sombra e a Escuridão" (EUA, 2001) reuniu os astros Michael Douglas e Val Kilmer em uma movimentada e tensa aventura nos confins da África, no século 19 (o filme é baseado em história real). A dupla precisa matar dois leões sanguinários e extremamente inteligentes que impedem a construção de uma ferrovia. As feras caçam juntas, sem medo dos homens ou do fogo. Pior, matam por prazer e não para se alimentar, e têm um instinto quase sobrenatural para perceber as armadilhas que lhes são preparadas. O famoso caçador Remington (Douglas) e o engenheiro civil Patterson (Kilmer) tentam deter esses implacáveis monstros. Mas, nesta impressionante história de homens contra feras, os caçadores tornam-se a caça.

Ação de primeira, bonitas locações, astros e uma direção eficiente fazem de "A Sombra e a Escuridão" um filme/documentário interessante. Mas é bom advertir que há cenas fortes (especialmente quando os leões atacam suas presas) e um clima de suspense do começo ao fim. Por isso mesmo, não é recomendado para pessoas muito sensíveis e, sobretudo, para crianças.

(Com informações do site www.videolar.com)

Uma Lição de Amor

"Uma Lição de Amor" (EUA, 2001) conta a história de um pai devotado em luta com a justiça e a sociedade para manter a guarda de sua filha. Engraçado e comovente, o filme mostra a enorme generosidade do espírito humano.

"Uma Lição de Amor" é a comovente história de Sam Dawson (Sean Penn, em atuação brilhante), um pai com deficiências mentais que cria sua filha Lucy (Dakota Fanning) ajudado por um grupo de amigos bem especial. Ao completar sete anos de idade, Lucy começa a ultrapassar seu pai intelectualmente, e a forte ligação existente entre os dois é ameaçada quando uma assistente social decide que a menina deve ir viver com uma família adotiva.

Diante de situação em que aparentemente é impossível sair vitorioso, Sam decide enfrentar o sistema legal e estabelece uma incomum aliança com Rita Harrison (Michelle Pfeiffer), uma poderosa e egocêntrica advogada que inicialmente aceita o caso apenas por ter sido desafiada a fazê-lo por seus colegas. Numa análise superficial, os dois não poderiam ser mais diferentes, porém, na realidade, possuem sutis semelhanças. A natureza compulsiva de Sam espelha a obsessão de Rita em ser aceita socialmente, que é vista com mais naturalidade pela sociedade. Sua busca de perfeição e sucesso a distancia de seu filho e vem destruindo lentamente sua auto-estima.

Juntos, eles se empenharão em convencer o sistema de que Sam merece ter sua filha de volta e, ao longo desse processo, criam um vínculo que resulta num testemunho singular do poder do amor incondicional.

(Webcine.com.br)

sexta-feira, maio 05, 2006

"Meu Nome é Rádio": as várias faces do preconceito

Apesar de afirmarmos que respeitamos as diferenças e não somos preconceituosos, a questão da discriminação e da intolerância mútua é uma realidade em nosso mundo e em nosso país também. Infelizmente, os discursos de igualdade não passam de mera falácia. É por isso que o filme "Meu Nome é Rádio" (2003, direção de Michael Tollin) não perde a atualidade e aborda a questão do preconceito em relação a pessoas portadoras de necessidades especiais e que apresentam maneiras diferentes de aprendizagem.

Além de uma bela atuação de Cuba Gooding Jr, a trama expõe o lado discriminador de todos nós. A abordagem ocorre em torno da incapacidade humana de compreender o seu próximo, respeitá-lo e verdadeiramente apoiá-lo para que consiga ter uma convivência saudável com aqueles que o rodeiam. Recheado de cenas emocionantes e sem a violência barata e banal que permeia a maioria dos filmes cuja temática é o preconceito, "Meu Nome é Rádio" é baseado em uma história real. Traz à tela a história de personagens de "carne e osso" que viveram na pele as várias faces do preconceito em uma sociedade que teima em se diferenciar e não em se unir para crescer.

Felipe Lemos é jornalista em Florianópolis, SC.

terça-feira, maio 02, 2006

O Terminal

A história é absurda: ao chegar aos Estados Unidos depois de uma longa viagem de avião, Viktor Navorski descobre que seu país de origem, Krakozhia, foi palco de um golpe militar. Como os americanos não reconhecem a legitimidade daquele novo governo, o passaporte do viajante é invalidado. Sem poder entrar na América do Norte ou retornar ao seu próprio país, Viktor é obrigado a passar meses no terminal do aeroporto de Nova York. Pois bem: apesar de absurda, a história é real. Aliás, foi até suavizada: na verdade, o iraniano Merhan Nasseri passou nada menos do que 16 anos no aeroporto Charles de Gaulle, em Paris, permanecendo ali mesmo depois de ter conseguido autorização para sair do prédio (o que, do ponto de vista psicológico, não deixa de ser fascinante).

Depois de dar origem a uma produção francesa em 1993 (Caídos do Céu), o drama de Nasseri atraiu o interesse de Steven Spielberg, que decidiu adaptá-lo novamente para as telonas. Infelizmente, para o cineasta não bastava contar a história de um anônimo surpreendido por uma situação atípica que o obriga a se adaptar a um confinamento quase surreal. No mundo cinematográfico em que Spielberg vive, é preciso mais do que isso; é fundamental ser um herói, uma celebridade, alguém que desperta a admiração de todas as pessoas. Em suma: é necessário ser um personagem, não um indivíduo.

Não é à toa que os melhores momentos de "O Terminal" (2004) se encontram em sua metade inicial, quando conhecemos Viktor e o acompanhamos enquanto descobre que seu país está em guerra e que, conseqüentemente, ele se tornou um "cidadão de lugar nenhum". Sempre eficiente, o excepcional Tom Hanks confere grande carga dramática ao personagem, que precisa lidar com as dificuldades impostas por seu desconhecimento do inglês e com a frustração de encontrar-se em um dilema que nem ele nem os funcionários da Imigração conseguem compreender totalmente. Utilizando um sotaque que consegue ser engraçado sem soar falso, Hanks domina com tranqüilidade os diversos tons do filme, conseguindo provocar o riso ou a emoção do espectador sem carregar em sua composição.

Da mesma forma, Spielberg se sai admiravelmente bem nesta primeira hora de projeção: além de conduzir a trama com segurança, ilustrando a adaptação de Viktor ao terminal (a estratégia utilizada para conseguir dinheiro através da devolução de carrinhos é genial), o diretor cria vários planos memoráveis, como aquele que começa próximo ao rosto do protagonista e se afasta dezenas de metros, sobre uma grua, a fim de retratar o isolamento e a insignificância do personagem frente à situação na qual se encontra. Além disso, a fotografia de Janusz Kaminski, parceiro habitual de Spielberg, é de extrema competência – principalmente se considerarmos que ele estava trabalhando em um set repleto de superfícies capazes de refletir a equipe ou o equipamento.

É uma pena que, gradualmente, "O Terminal" deixe de ser um interessante estudo de personagem e se transforme em um drama tipicamente hollywoodiano – uma mudança que pode ser percebida através da própria alteração sofrida ao longo da projeção pelo personagem de Stanley Tucci, o diretor do aeroporto. A princípio, Frank Dixon é um sujeito que, por não saber o que fazer com Viktor, decide deixá-lo livre no aeroporto com a esperança de que ele tente fugir, o que transferiria o problema para o FBI. Porém, ao perceber que Viktor não pretende sair do terminal sem permissão, Dixon procura encontrar outras formas de resolver a questão, chegando até mesmo a encontrar uma solução e apresentá-la ao imigrante (o que resulta numa das cenas mais engraçadas do filme). Infelizmente, logo em seguida os roteiristas Jeff Nathanson e Sacha Gervasi decidem converter Dixon em um vilão estereotipado, enfraquecendo o conflito ao torná-lo inverossímil (a "raiva" do diretor do aeroporto por Viktor jamais soa autêntica). Como se não bastasse, ainda há uma sugestão de "redenção" que soa simplesmente ofensiva.

Para piorar, o filme apela para uma série de gags físicas que, além de não funcionarem, diluem a força dramática da história: como Viktor vive tropeçando, trombando em portas de vidro, entrando nos banheiros errados e escorregando no chão úmido, o espectador encontra dificuldades para identificar-se com ele, já que o sujeito praticamente se transforma em uma espécie de Inspetor Closeau búlgaro (ou melhor: krakozhiano). Além disso, o roteiro falha ao não explicar por que Viktor, depois de tentar ligar para sua casa no início da projeção, jamais volta a fazê-lo – o que é incompreensível. Para piorar, "O Terminal" inclui uma série de personagens secundários incrivelmente caricaturais, como o latino apaixonado e o indiano exótico.

Apelando até mesmo para uma subtrama romântica boba e totalmente dispensável envolvendo Hanks e a aeromoça vivida por Catherine Zeta-Jones, o filme finalmente desmonta no terceiro ato, quando o motivo da viagem de Viktor (que não vou revelar) é apresentado como se fosse uma grande surpresa. Além de ridícula, a tal revelação soa como uma tentativa desesperada e final de Spielberg para provocar as lágrimas do público – no que acaba falhando.

Curiosamente, foi justamente por se entregar ao maniqueísmo e ao sentimentalismo barato que o cineasta já havia falhado em "Amistad" e "A.I. Inteligência Artificial" - dois outros raros tropeços na carreira espantosamente regular de Steven Spielberg.

(Cinema em Cena)

"O Pianista"

Durante a II Guerra Mundial, o famoso pianista judeu polonês Wladyslaw Szpilman vê sua família ser deportada, em 1942. Ele consegue se salvar, por puro acaso, do comboio da morte. Um policial, também músico, o arranca do vagão. Mas é enclausurado junto com outros milhares de judeus no Gueto de Varsóvia, errando às escondidas durante mais de dois anos e passando por sofrimentos, humilhações e lutas impossíveis numa Varsóvia dominada pelos nazistas. Doente, solitário e faminto, deve sua vida a outro oficial alemão, católico, Wilm Hosenfeld, que tem uma paixão exagerada pela música. Abalado pelos crimes nazistas, decide ajudá-lo a sobreviver.

Três etapas dividem o filme ("O Pianista", 2002): a opressão sufocante da sucessão de leis anti-semitas, que os judeus da época queriam acreditar, a cada novo decreto, que aquele seria o último. O medo, frente ao nazismo, presença estranha e desumana, que ameaçava pessoas e famílias inteiras. Enfim, o inexplicável dos crimes imprevisíveis e frios, que não deixam margem para esperanças. Polanski consegue fazer esta reconstituição com rara autenticidade. No filme "O Pianista" não se chora, mas um sentimento de revolta e de raiva se apodera do espectador diante da maldade dos carrascos.

Neste filme, o diretor Roman Polanski quis reatar seus laços com sua origem judeu-polonesa, com infância passada no Gueto de Cracóvia. Sua mãe morreu no campo de concentração e, embora seu pai tivesse sobrevivido, o mais terrível de tudo é que uma criança resiste a tudo, mas fica marcada para sempre quando é separada dos pais, diz Polanski, em entrevista a O Estado de S. Paulo, em 9 de outubro de 2002. "Sempre soube que um dia faria um filme sobre o Gueto de Varsóvia, sobre esse período doloroso da história da Polônia, mas não queria que fosse autobiográfico. Desde a leitura dos primeiros capítulos das memórias de Szpilman, soube que 'O Pianista' seria objeto de meu próximo filme. Era a história que eu precisava: apesar do horror, positiva e cheia de esperança. Sobrevivi ao bombardeio de Varsóvia e ao Gueto de Cracóvia e quis recriar as lembranças de minha infância. Quis ficar o mais perto possível da realidade e não filmar à moda de Hollywood."

A história de Spzilman permitiu a Polanski reviver sua própria história e o tema do isolamento humano, tão caro a ele, reaparece no filme através de janelas: quando Spzilman é obrigado a pular de abrigo em abrigo, de um apartamento de amigos poloneses para outro, vemos o Gueto de Varsóvia através de seus olhos. Vemos o que ele vê e, mais importante ainda, da forma como ele vê. Esses fatos estão inscritos na sua consciência e vão moldar sua memória para o resto da vida.

No livro que escreveu, Szpilman nunca se coloca como herói, mas como um sobrevivente acidental, um homem que por ironia do destino deve sua vida ao inimigo.

** PASSADO COMUM

Vários filmes, como "A Lista de Schindler", de Spielberg, ou "A Vida é Bela", de Roberto Begnini, tentaram mostrar a dimensão do que foi o Holocausto. Algumas das cenas do filme "O Pianista" impressionam por seu realismo. A cena final, em que Szpilman se encontra na Varsóvia do fim da guerra, parece uma arena de sobreviventes de um pesadelo.

Foi difícil achar os lugares em ruínas que a história exigia. Portanto, foi necessário reconstruir a cidade a partir de vários elementos. Algumas ruas foram inteiramente reproduzidas em um estúdio de Berlim.

Polanski sabe que o cinema é incapaz de recriar o passado. Mas a história de Szpilman está aí para servir à visão de Polanski. Numa das cenas mais emocionantes do filme, o oficial que o salva da morte ordena ao pianista que toque, a fim de provar que é mesmo talentoso e famoso. Szpilman obedece, mesmo sem ter tocado desde o início da guerra. A cena é um tributo ao significado da sobrevivência.

Em outra cena inesquecível, antes de embarcar nos trens para os campos que matariam seus pais, duas irmãs e um irmão, o autor divide com eles uma barra de caramelo cortada em seis, sua última refeição juntos. Em nenhum momento do livro, Szpilman mostra desejo de vingança. No fim da guerra, tenta encontrar e salvar da prisão russa o oficial alemão que o tinha ajudado.

No filme, Polanski processa sua própria biografia e faz seu auto-retrato com a ajuda de outro auto-retrato. Mesmo sendo tocado diretamente pelo tema, rejeita a emoção fácil e faz o espectador descobrir mais um surpreendente testemunho do heroísmo do Gueto de Varsóvia. Tanto no livro como no filme, "O Pianista" toca fundo em nossa alma. Sua lucidez e coragem, em condições onde uma migalha de pão fazia a diferença entre a vida e a morte, conseguem transmitir uma lição de vida. Como documento, "O Pianista" nos dá a oportunidade de acompanhar a trajetória de um homem determinado a viver, a qualquer preço. O lirismo do músico, aliado a uma inteligência crítica, faz o espectador querer ir cada vez mais fundo em seu passado. E assim como Polanski se identificou e se emocionou com esse vigoroso relato, nós, também, revivemos através do filme, uma vez mais, um dos mais dramáticos episódios da História Judaica: a destruição em massa dos judeus de Varsóvia.

(Do site Morasha)

Encontrando Forrester

Apesar da sensação de algo já visto que "Encontrando Forrester" (Finding Forrester, 2000) pode dar, pois repete a trama de "Gênio Indomável", dirigido pelo mesmo Gus Van Sant, trata-se de um filme muito bom. Principalmente pela atuação do magnífico Sean Connery (o eterno James Bond, o agente 007).

É um prazer imenso vê-lo em cena; e como o escritor William Forrester ele está ainda mais convincente. Connery é daqueles atores que cativam o espectador, dando uma sensação de intimidade. É como ir ao cinema para reencontrar um velho conhecido.

Em "Encontrando Forrester", o "gênio indomável" é Jamal (o estreante Rob Brown), um jovem estudante, bom jogador de basquete e com aspirações literárias. Residente no sul do Bronx, com sua mãe e irmão, Jamal e seus amigos sentem curiosidade em relação ao solitário morador do apartamento em frente à quadra onde treinam. Ele é Forrester, o escritor vencedor do prêmio Pulitzer com seu primeiro romance, que vive recluso e nunca mais escreveu outro livro.

O personagem é associado a escritores excêntricos, como J. D. Salinger. Os amigos desafiam Jamal a invadir o apartamento de Forrester. Ele aceita a provocação, mas, ao ter que fugir rapidamente, esquece sua mochila no local. Quando a recupera, percebe que Forrester mexeu em seus cadernos e corrigiu seus textos.

A partir daí, inicia-se uma amizade entre os dois e Forrester torna-se o mentor intelectual de Jamal. Nesse ínterim, os bons resultados de Jamal nos testes escolares o levam a obter uma bolsa de estudos na escola particular freqüentada por "filhinhos de papai". Acertou em cheio, quem apostou que é ali que começam os problemas de Jamal.

Não bastasse ser pobre, Jamal também é negro. Daí para ser discriminado pelos colegas não precisa muito. Mas não é apenas isso. O excelente aluno (além de jogar bem, Jamal é inteligente e articulado) também é perseguido pelo professor Crawford (F. Murray Abraham, de Amadeus), um escritor frustrado.

"Encontrando Forrester" é até melhor que "Gênio Indomável", a história flui bem, não apela demais para tons edificantes; e Jamal não repete o personagem de Matt Damon, que, por sinal, faz uma brevíssima participação no final do filme.

A produção realça a amizade dos personagens, a importância da presença de Jamal na reclusão de Forrester. Ele acreditava que tudo já estava definido em sua vida, que não havia mais nada a ousar. A parceria entre o ator estreante e o tarimbado Connery funciona muito bem. Por isso, em alguns momentos "Encontrando Forrester" emociona.

(Universo HQ)

sexta-feira, abril 28, 2006

Lutero

"Lutero" (Alemanha, 2003), versão cinematográfica sobre a vida de Martinho Lutero, o grande reformador do século XVI, é a produção de uma associação de cunho eclesiástico, Thrivent for Luterans. Filmada em 2003, conta com a direção de Eric Till, experimentado cineasta, e a participação de grande elenco de estrelas, dentre as quais se destaca a lendária figura de Peter Ustinov, no papel de Frederico da Saxônia.

O filme em si, segundo o princípio pedagógico que sustenta a idéia de que a aprendizagem pelo ouvir aumenta em proporções maiores pelo ver, já é uma significativa contribuição ao conhecimento histórico daquela fase do Cristianismo. Nesta resenha, não se pretende estruturar uma crítica dos elementos e recursos da dramaturgia que envolvem a encenação; mas destacar alguns aspectos históricos e teológicos, que por divergência ou omissão, se prestam a tal finalidade.

** LUTERO DIVIDIU A IGREJA?

No filme, a figura de Lutero ressalta na projeção de quase todas as cenas gravadas. Começa com a decisão de se tornar monge, ao sofrer os efeitos aterradores de uma seqüência de raios a cair no campo que ele atravessava. Seu martírio, nas cenas de auto-flagelação, corroboram a luta de consciência que experimentava por causa do sentimento de culpa. Seu reconhecimento sobre os méritos de Cristo, como causa única de perdão, o levam a contrariar as propostas do papado, de salvação mediante a venda de indulgências. Dessa maneira, Lutero torna-se o líder de multidões, enfrentando com coragem as pressões políticas da autoridade Real e da Igreja; apesar da fisionomia calma, quase impassível, que mostra em todo momento o ator que o representa.

Esses fatos, encenados dessa maneira, parecem confirmar o propósito dos idealizadores - o qual está claramente exposto no cartaz principal do filme, com os seguintes epítetos: “O Homem que Mudou o Mundo”, e “O Homem que dividiu a Igreja”.

Ninguém duvida que Lutero tenha sido o grande reformador da Igreja; mas, que ele e só ele tenha efetuado essa obra, é, no mínimo, ignorar o papel desempenhado por dois movimentos que o precederam, cuja função foi a de aplainar sua estrada de atuação. Esses dois movimentos foram a Pré-reforma e o Humanismo.

A Pré-reforma não foi um movimento unificado que apresentasse características típicas de uma organização social. Foi, sim, a contribuição individual, algumas vezes o clamor de eremitas emitindo vozes para os quatro ventos, clamando por uma nova forma de religiosidade. A Pré-reforma foi o despertar de uma nova aurora tanto racional como religiosa com a finalidade de tornar a Igreja uma sociedade capaz de manter comunhão com Deus e cumprir sua missão.

Enumerar esses paladinos da nova esperança é só uma tentativa obstinada de manter na memória alguns personagens como Cláudio de Turim, Pedro de Bruys, Arnaldo de Brescia, Pedro Valdo, Tanquelmo, Eudo de Estela, Pedro Grossetete, Wicleff, João Hus, Savonarola - alguns dos quais testemunharam suas aspirações com a própria vida.

Não menos relevante e oportuno, para o processo de reforma, foi o movimento filosófico literário denominado “Humanismo”. Embora as pretensões das principais figuras desse movimento não tivessem o ideal de religiosidade, suas obras foram um desafio e acusação contra o autoritarismo e corrupção do papado. Figuram entre esses autores: Francesco Petrarca, cujas obras escritas em latim condenavam a corrupção do clero; Giovanni Boccaccio, autor de Decamerone, obra de humorismo anti-clerical; Tomas Morus, que deixa transparecer seus desejos de reforma com suas obras Utopia e Restitutio Christianismi; Francesco Fillelfo, que propõe na sua obra Theologia Platonica da Immortalitate Animorum uma nova fórmula de salvação; Dante Alighieri, com sua Divinita Commedia, condena ao inferno vários prelados da Igreja; Erasmo de Rotherdam, contemporâneo de Lutero, escreveu Moriae Encomium, uma sátira contra o clero.

** IGNORÂNCIA E SUPERSTIÇÃO: ARMAS DO PAPADO

No filme, nas cenas em que Lutero aparece transitando pelas ruas da Roma papal, o espectador tem uma clara imagem da deplorável condição social da maioria das pessoas, consideradas súditos do rei e devotos do papa. Essa condição social pode ser expressa em dois termos: ignorância e superstição. Foram essas condições as desejadas pelo papado para configurar seus projetos de domínio das consciências humanas. A ignorância deixava as pessoas na incapacidade de visualizar a forma correta de aproximar-se de Deus; a superstição permitia ao papado extorqui-las com ameaças do fogo infernal.

As cenas projetadas, que exibem essa condição social, impressionam ao apresentar multidões de famintos e esfarrapados, vítimas anônimas da exploração clerical, depositando nos cofres papais suas míseras moedinhas, para poderem eles e seus queridos falecidos se livrar das assaduras eternas do inferno. O próprio Lutero segue, em cena, uma longa fila para apreciar com reverência o crânio de João Batista, e na condição de penitente, ascende de joelhos sobre os degraus da “Escada de Pilatos”, aquela que, segundo o papado, Jesus subiu durante seu julgamento e que foi levada por anjos até seu lugar, em Roma. Logicamente, esses objetos como todas as relíquias dessa época eram fraudulentos.

A corrupção, do ponto de vista da imoralidade sexual, tem no filme uma pequena cena reveladora, quando um prelado, vestido a caráter, e uma prostituta concordam em ter uma relação sexual. Essa encenação, sendo a única desse gênero, chega até absolver da falta de pudor a cúpula do papado. Mas, a História não o fará.

Nos decênios e séculos precedentes ao período da Reforma Luterana, o palácio papal chegou a ser transformado em antro da mais profícua forma de depravação. Ali foram engendrados inúmeros filhos, alguns dos quais protagonizaram as mais temíveis atitudes de delinqüência e imoralidade, como Crescêncio, filho da inescrupulosa Teodora com o papa João X; Jerônimo Riário, com excessiva ambição de poder e assassino, filho do papa Sixto IV; os seis filhos do papa Inocêncio VIII, enriquecidos com o favor da imunidade e da violência; César Borgia, filho do papa Alexandre VI, cuja vida inspirou o que de mais perverso pode a literatura expressar.

Devido à condição social das pessoas, naquele período da História e da corrupção do papado, o ambiente para uma execução reformadora dos procedimentos da Igreja e dos meios de alcançar a salvação, estava plenamente configurado. O último impulso para dar início ao movimento reformador foi determinado pela presença do representante papal, oferecendo os benefícios das indulgências.

Nas cenas do filme, o representante papal, Tetzel, aparece numa atitude semelhante à de traficante de quinquilharias, porém, aureolado com ostentação e truculência quando deixa passar a palma da mão pelas chamas de uma tocha acesa, diante dos olhares atônitos do povo supersticioso. Poderia ser mais objetivo o apelo para a compra de indulgências?

As convicções de Lutero sobre a comercialização de indulgências era o oposto das propostas papais. A reação dos prelados foi decisiva e em certa medida contundente. Finalmente, Lutero foi intimado a depor na Dieta de Worms, diante da sua majestade o jovem rei Carlos V. Perante representantes da Igreja e dos nobres da Europa, Lutero, diante do inquisitorial pedido de retratação, respondeu na altura e profundidade que a ocasião requeria: não se retrataria das suas idéias.

** LUTA DE CLASSES

No filme, a resposta de Lutero, soa como o grito libertário de uma classe oprimida, e é seguida por consignas de ordem política que descambam em atitudes de terror e pilhagem. Essas cenas, as quais provavelmente reproduzem o que realmente aconteceu, só tendem a confirmar a teoria de Karl Marx sobre a História. Para esse teórico social, os eventos históricos acontecem como uma expressão de luta de classes; ou seja, o encontro em ambiente de beligerância, de grupos sociais qualificados como opressores e oprimidos, ou ricos e pobres. Os primeiros estariam representados pelos prelados católicos, e os outros estariam representados pelas camadas sofredoras do povo indefeso.

Nos registros da História se encontra a rebelião armada de camponeses que ocorreu no ano 1525, na Alemanha, ou seja, pouco depois da Dieta de Worms. A causa desse levante era a situação social e econômica à qual estavam submetidos os camponeses. O Feudalismo os havia reduzido a um estado de virtual “escravidão”, sem proteção das leis. Dessa forma, estimulados pela rebelião religiosa propiciada por Lutero, os camponeses ficaram mais fortes e decididos nas suas pretensões, e a Reforma se tingiu com a cor da política e o movimento social. O próprio Lutero procurou conciliar as facções, e não conseguindo, condenou a rebelião dos camponeses. Cabe destacar que a repressão dos latifundiários sobre os camponeses foi executada com crueldade.

Fica difícil, através das cenas do filme, tentar argumentar a favor da influência positiva, ou melhor, da elevação de espiritualidade que os argumentos sobre a salvação, resumidos na consigna “o justo viverá pela fé”, tenha causado entre as multidões daquela época. Em lugar da piedade, surge a intolerância; a consagração a Deus cede ao instinto de vingança; a fraternidade cristã é substituída pelo rancor e morte de milhares de pessoas, algumas vítimas indefesas.

** MAIS DO QUE JUSTIÇA SOCIAL

No filme, as escassas cenas de ambiente de prosperidade espiritual promovida pelo movimento de Lutero se observam na reunião dos príncipes que apóiam a causa luterana, celebrada antes do encontro com o rei Carlos V. A outra é na atitude de humildade diante do rei Carlos V, na Dieta de Ausburgo, confirmando sua decisão de não seguir as tradições católicas, ainda que essa atitude lhes custasse a própria vida. Era o “protesto” dos príncipes, embora nas cenas permaneçam excluídas e nem sequer se faça menção da “Confissão de Ausburgo”, que contém a declaração da doutrina da salvação mediante a fé em Cristo Jesus.

Independente da humilde atitude dos príncipes presentes na Dieta de Ausburgo, a História registra a conformação de uma aliança militar, denominada Liga de Torgau que tinha a finalidade de preservar os principados da autoridade católica. Mais tarde, a expansão do luteranismo determinou a conformação de outra aliança, denominada Liga de Smalkalda, que teve seu fim trágico no ano 1547, na batalha de Mühlberg, onde foram fragorosamente derrotados pelos exércitos de Carlos V.

Concluímos com uma favorável asseveração sobre o filme na sua apresentação plena. No entanto, é preciso destacar, em síntese, que o movimento de Lutero, embora tenha sido levado pelos ventos da reivindicação político-social, permitiu que o cristianismo ou os seguidores de Cristo e seu evangelho bíblico tivessem a oportunidade de conhecer o verdadeiro processo de redenção: a justificação pela fé.

Dr. Rúben Santos Aguilar é professor de História do Cristianismo do Curso de Teologia do Centro Universitário Adventista, Campus Engenheiro Coelho (SP). Texto originalmente publicado na revista eletrônica Kerygma.

quinta-feira, abril 27, 2006

A Paixão de Cristo: espaços demarcados

Êxtase, repulsa e euforia são algumas das expressões mais adequadas para descrever o turbilhão de reações suscitadas pela exibição do polêmico e controverso "A Paixão de Cristo" (The Passion of the Christ, Estados Unidos, 2004), de Mel Gibson. Tudo ou quase tudo já se falou a respeito do conteúdo da película. Contudo, a carnificina extensa e o impacto causado pelas cenas chocantes e interpretadas em latim e aramaico impediram que o espectador médio passasse do nível da sensação para o da percepção.

Nesse contexto, é mais relevante interpretar o efeito do que a forma, apesar de ambos estarem interligados. A recepção diversa que "A Paixão" teve em vários segmentos religiosos revela que estes demarcam cada vez mais seus espaços ideológicos, o que, inevitavelmente, gera guerra e preconceito.

Uma análise pormenorizada sobre a recepção de "A Paixão" revela duas espécimes dessa demarcação. A primeira, mais óbvia e mais propagada, é a visão da comunidade judaica. Segundo a maioria dos rabinos, o filme reafirma a idéia de que foram os judeus os verdadeiros e únicos responsáveis pela crucifixão de Jesus, suscitando o anti-semitismo.

Ora, o filme não é anti-semita. Enfatiza, é verdade, a participação histórica dos judeus no assassinato, mas não busca responsabilizá-los. O próprio Gibson garante que não teve nenhuma intenção preconceituosa ao produzir o filme. Infelizmente, o purgatório dos católicos e o inferno dos judeus está repleto de boas intenções. "A Paixão" não escapa dessa máxima.

A perseguição e o sofrimento milenares ainda fazem parte do cotidiano dos judeus. Somente o Holocausto seria um bom exemplo. Como o cinema, por si só, pressupõe certa subjetividade, o que dá vazão a várias interpretações da mesma imagem, é compreensível que as cenas de Jesus sendo espancado por uma turba judaica e a clara exigência de sua morte por seus líderes religiosos reabram feridas que, vez ou outra, ainda insistem em sangrar.

Na defensiva, essa gente denuncia que ainda não se perdoou pelo triste episódio e que o preconceito, por mais paradoxal que isso possa parecer, renasce em seus próprios corações dia após dia. Os judeus demarcam, assim, seu próprio espaço.

** DE UM CATÓLICO PARA EVANGÉLICOS

Num foco distante da Palestina, "A Paixão de Cristo" também denota a demarcação dentro da própria religião cristã. Ironia: apesar de Gibson praticar o catolicismo ultraconservador, o grande público apreciador de seu filme concentra-se na ala evangélica. Recepção no mínimo curiosa, principalmente quando se constata que os evangélicos sempre condenaram a produção de Hollywood.

Com o lançamento do filme no Brasil, ocorreu verdadeira fidelização por parte desse segmento. Registraram-se peregrinações de grupos evangélicos ao cinema, compra e aluguel exclusivo destes por alguns segmentos e a exibição pública no interior de seus templos durante a sexta-feira da Paixão.

Ao analisar-se o perfil da película e do discurso evangélico em geral, percebe-se que ambos se assemelham. O primeiro faz uma leitura das doze últimas horas da vida de Jesus, com ênfase em sua dor física, e deixa em segundo plano sua vida e seus ensinamentos; o segundo - apesar de protestos contrários - faz basicamente o mesmo. Apelos em pregações, produção literária e musical e aplicação para a vida cotidiana sempre acabam levando para a cruz, seja qual for o caminho.

Adicione às similaridades o alto grau de emoção e sensação que ambos, filme e culto evangélico, proporcionam. Fiéis dirigem-se ao cinema como quem vai a um culto: emocionam-se, choram, ensaiam conversões.

Por outra senda se enveredam os membros da Igreja Católica. Para seus praticantes mais conservadores (com exceção do próprio Gibson), a forte carga de violência é desnecessária. Na doutrina católica, a cruz é um pouco menor, a fim de dar espaço para a santidade de Maria, ausente na película. Já a conversão emocional é substituída pelas rezas e terços, também inexistentes em "A Paixão". Por fim, o filme acerta na divulgação de duas de suas doutrinas, o lenço de Verônica e o Santo Sudário. Mas não é dos melhores; é preferível o poder francamente catequizador de "Maria, Mãe do Filho de Deus".

Sem preconceitos. Estes são apenas dois vieses do cristianismo escolhidos pelo segmento evangélico e católico, respectivamente, para visualizar a fé. O fato é que uma observação atenta do público de "A Paixão" demonstra o abismo ideológico entre as denominações. O filme dá, assim, munição para a guerra entre católicos e evangélicos.

** CINEMA ECUMÊNICO?

Mel Gibson não pretendia ser ecumênico; a produção cinematográfica também não. Vieses e estereótipos são ingredientes garantidos ao se tratar de cinema. O problema é que produções religiosas sempre causaram e sempre causarão espasmos e vertigens. O grande problema é que a polêmica não traz remissões, mas espaços demarcados com cada vez mais ênfase.

Serve de consolo que o próprio Cristo afirmou que não veio trazer paz, mas sim espada. Ao que parece, Gibson achou-se no direito de agir sob o mesmo princípio.

Fernando Torres é jornalista e editor assistente na Casa Publicadora Brasileira.

terça-feira, abril 25, 2006

Os Miseráveis

“Os Miseráveis” (1998), dirigido por Billie August, é um dos melhores (senão o melhor) filmes que já assisti. É a brilhante adaptação do clássico romance homônimo de Victor Hugo. O filme conta a história de Jean Valjean (Liam Neeson) que, depois de cumprir 19 anos de prisão com trabalhos forçados por ter roubado comida, é acolhido por um bondoso bispo (Peter Vaughan), que lhe provê alimento e abrigo. Não resistindo aos seus impulsos, no meio da noite Jean rouba a prataria da casa e agride seu benfeitor. Na fuga, o ladrão acaba preso pela polícia que o leva até o bispo. Os policiais perguntam ao religioso se aquela prataria é dele. O bispo diz que havia dado aquilo a Jean e ainda pergunta por que ele tinha esquecido os castiçais. A atitude perdoadora daquele homem devolve a fé que o amargurado Jean havia perdido fazia tempo.

Nove anos depois, o senhor Valjean é uma pessoa totalmente diferente. Havia se tornado prefeito e o principal empresário em uma pequena cidade. Mas sua paz acaba quando Javert (Geoffrey Rush), um guarda da prisão onde Jean esteve, desconfia de que o prefeito é o ex-prisioneiro que nunca se apresentou para cumprir as exigências da liberdade condicional. A penalidade para essa falta era prisão perpétua, mas o guarda não consegue provar que o prefeito e Jean Valjean são a mesma pessoa.

Enquanto Javert procura incriminar Jean, uma das empregadas do empresário, Fantine (Uma Thurman), é despedida e se vê obrigada a se prostituir para sobreviver e alimentar a filha pequena, que é criada por terceiros. Fantine acaba presa e fica muito doente. Descobrindo o que aconteceu com sua ex-empregada, Jean usa sua autoridade para libertá-la e a acolhe em sua casa. Vendo Fantine à beira da morte, o prefeito promete cuidar da filha dela. No entanto, antes de pegar a criança, sente-se obrigado a revelar sua verdadeira identidade, a fim de evitar que um prisioneiro, que acreditavam ser ele, seja preso em seu lugar.

Daí para frente, Javert volta a perseguir Jean, Fantine morre e o ex-prefeito foge com a filha dela, sendo perseguido durante anos pelo implacável Javert. O desfecho da história é muito emocionante. Mas prefiro não contá-lo. Assista ao filme ou, melhor ainda, leia o ótimo livro de Hugo. Disso você não vai se arrepender.

"Os Miseráveis" é uma história que fala de nobreza, perdão e compaixão. Valores cristãos por excelência.

Michelson Borges é jornalista e autor do livro Nos Bastidores da Mídia (www.cpb.com.br).

Jovem gosta é de autoridade

O jornalista Silóe de Almeida, que é também pastor adventista, disse certa vez que os jovens gostam de alguém que saiba usar autoridade, diferente do senso comum que apóia a idéia de rebeldia juvenil, aquela que não escuta ninguém, não respeita hierarquia e demonstra tendência para a marginalidade. Ele acredita que essa visão é imposição da mídia, aliada a uma busca de rumo perseguida pela própria juventude. Para o jornalista, a mais clara demonstração de que os jovens anseiam por autoridade é o crescimento da conversão de jovens ao Islamismo na Europa, uma religião com regras rígidas, e que aponta caminhos claros.

Lembrei dessa declaração após assistir "Coach Carter - Treino para a Vida" (2004), filme magistralmente estrelado pelo ator Samuel L. Jackson e dirigido por Thomas Carter. Trata-se de uma história baseada na incrível experiência de Ken Carter como professor do time de basquete da Richmond High School, que não conseguia vencer uma partida sequer.

O filme começa mostrando a chegada de um novo professor de basquete a uma escola típica das comunidades negras e pobres americanas, onde os jovens parecem à margem de qualquer cuidado governamental, demonstram nenhuma perspectiva de futuro e muito menos respeito a qualquer tipo de ordem estabelecida. Fica evidente o envolvimento dos jovens com as drogas, apesar de não ser explorado no roteiro (deixando claro que é possível, sim, fazer bons filmes sem consumo explícito de drogas, violência e sexo, por exemplo). Nesse cenário, surge o professor Carter, com a missão de resgatar a auto-estima dos jovens jogadores de basquete, notadamente um dos valores da escola.

Ao chegar, porém, Carter mostra ser mais do que um mero técnico esportivo. Evocando disciplina rígida, quase militar, ele conquista o respeito dos alunos rebeldes. Aos poucos, eles assimilam os regulamentos de Carter. As vitórias no esporte começam a aparecer. Mas surge um problema: os alunos não correspondem com um bom aproveitamento escolar, uma das exigências que Carter estabeleceu no contrato.

Na medida em que os estudantes não conseguiam bons resultados escolares, Carter cancela treinos e até jogos, no momento em que o time escolar já é um orgulho no bairro. A revolta é geral. Pais e professores protestam contra o professor. Ameaçam romper com as regras estabelecidas por Carter. Para eles, o professor Carter é um empecilho para aquele momento, que consideram ser o melhor que aqueles jovens podem conseguir. A partir daí, o professor tenta mostrar que há um futuro esperando por aqueles jovens, que ia muito além das quadras de basquete.

O filme mostra como é importante ter alguém que mostre uma perspectiva de futuro aos jovens. Carter oferece para seus atletas algo mais do que a glória momentânea do esporte, algo que nem os pais entendem. O técnico oferece uma vitória na vida, algo permanente, conseguido pelos estudos e que não foi conquistado pelos pais, vítimas de um sistema que os impedia de ter uma saudável ambição na vida.

Coach Carter deixa lição maravilhosa. É um dos filmes imprescindíveis, especialmente para quem trabalha com jovens. Mostra que relativizar preceitos e regulamentos para parecer simpático, por exemplo, nem sempre é o melhor caminho, e nem é isso que os jovens querem. Como sempre, e a despeito de toda uma cultura em contrário, é importante ter alguém que aponte para bons caminhos.

Heron Santana é jornalista em Recife, PE. Texto publicado originalmente no blog Parajornalismo.

O Oscar Schindler adventista

Depois que intensifiquei alguns projetos e comecei meu MBA na Universidade de Pernambuco, tenho tido cada vez menos tempo para coisas de que gosto, como ler, por exemplo. Ou assistir algo como "Hotel Ruanda" (2004), um contundente relato do que foi o genocídio nesse país da África, resultando na morte de 800 mil pessoas.

O filme conta a história de Paul Rusesabagina (brilhantemente interpretado pelo ator Don Cheadle), gerente do Hotel Des Milles Collines, por ocasião do recrudescimento do ódio entre as duas etnias que dividem o povo ruandês: os hutus e os tutsis. O acirramento aumentou com a morte do presidente Habyarimana, fiador de um acordo de paz entre as etnias. O líder, da tribo hutu, foi morto por membros do seu próprio partido, que não tardaram em culpar os tutsis e iniciar o maior massacre da história contemporânea.

Paul, um hutu, era casado com a tutsi Tatiana (Sophie Okonedo) e usou todas as suas influências com pessoas ligadas ao governo, guerrilha e militares para salvar a vida de sua família. Como manda-chuva do luxuoso hotel, "um oásis no deserto", ele faz mais do que isso. Salva 1.268 pessoas, refugiados, órfãos, feridos que conseguem chegar ao hotel e por algum detalhe divino escapam do triste destino de virarem meras estatísticas na lista de assassinados. Para proteger o local e os "hóspedes", Paul subornou com dinheiro, bebidas, charutos e o que mais tinha à mão e, quando o material acabou, apelou à vaidade alheia e à influência do dono belga (Jean Reno) da rede hoteleira, que tinha ligações próximas com primeiros-ministros e generais.

O filme se desenvolve em uma narrativa simples, quase didática, como se o diretor Terry George sentisse a necessidade de que todos entendessem o que aconteceu naquele país. A postura de Paul deixa uma extraordinária lição sobre como se comportar em momentos de crise intensa, como desenvolver uma negociação em situações extremas, e uma sensivel demonstração de vontade de salvar vidas sem nenhum valor em uma terra dilacerada.

O mais interessante é que o verdadeiro Paul Rusesabagina (na foto ao lado, à esquerda do ator Don Cheadle) estudou durante 12 anos em um colégio adventista do seu país, e formou-se em Teologia em Camarões, como você pode conferir nesta apresentação em PowerPoint. Conhecer a história desse líder ajuda a entender a postura de movimentos cristãos no episódio.

Heron Santana é jornalista em Recife, PE. Texto originalmente publicado no blog Parajornalismo.

segunda-feira, abril 24, 2006

Um grito no escuro

O ano de 1980 foi marcado por uma tragédia em M. T. Isa, Estado australiano de Queensland. O pastor adventista Michael e sua esposa Lyndi Chamberlain saem de férias com seus filhos Aldam, Reagan e Azaria. À noite, no acampamento em Ayers Rock (a maior rocha do mundo), Lyndi vê sua filha Azaria, de dois meses, ser atacada e levada por uma espécie de cão selvagem (dingo). Michael e Lyndi, desesperados, saem à procura do bebê, contando com a ajuda de outros acampantes e da polícia. Em vão. O corpo não é encontrado e a imprensa noticia o fato de maneira sensacionalista, criando boatos sobre sacrifícios e cultos estranhos. A família Chamberlain faz declarações à imprensa que as distorce, transformando-as em acusações. Lyndi acaba presa, condenada por assassinato. Oito anos depois do desaparecimento de Azaria, Michael e Lyndi são inocentados.

Esta história acabou rendendo um livro – Evil Angels , de John Bryson – que foi adaptado num filme dirigido por Fred Schepisi: “Um Grito no Escuro” (1993). O filme ganhou quatro Globos de Ouro (prêmio anual atribuído pela crítica estrangeira em Nova Iorque) e o prêmio de melhor atriz para Meryl Streep (no papel de Lyndi Chamberlain), no Festival de Cannes, além de uma indicação para o Oscar. Schepisi já havia trabalhado com Streep em “Plenty – O Mundo de uma Mulher”, e em “Um Grito no Escuro” conseguiu novamente tirar o máximo de sua atriz preferida.

Logo no início do filme, vê-se um caminhoneiro passando em frente a uma igreja adventista do sétimo dia e exclamando: “Adventistas desgraçados!”, deixando claro o preconceito de algumas pessoas em relação à igreja. Em Ayers Rock, um acampante estranha o fato de Michael (San Neill) não beber álcool e estar comendo um bife vegetariano, já que os adventistas procuram usar uma alimentação natural. Mas, depois do incidente com o bebê, o que mais deixa o público desconfiado é a reação da mãe, que parece aceitar, consolada, a trágica morte da filha. O público e a imprensa parecem ignorar que os adventistas crêem na ressurreição dos mortos por ocasião da segunda vinda de Cristo, uma de suas principais crenças. Mas ninguém, nem mesmo os repórteres, se detém para perguntar sobre isso.

Em busca de uma entrevista com Michael, um jornalista esconde seu real objetivo, dizendo que a matéria servirá para advertir o povo sobre o perigo dos dingos. O pastor aceita dar a entrevista, mas, na edição, suas declarações são totalmente manipuladas. “Notícia é arte”, diz irresponsavelmente o editor.

Dias depois, um turista encontra as roupinhas da criança morta e as recoloca no local, dobradas. A situação piora para Lyndi e uma série de boatos são criados: “Adventistas não gostam de crianças normais, e Azaria não era normal”; “Azaria significa sacrifício na selva”, e por aí vai.

Os forenses erram na avaliação das roupas, enquanto a polícia faz uma revista na casa dos Chamberlain, não respeitando sequer o sábado, dia sagrado segundo a Bíblia, e dedicado exclusivamente à religião a às obras assistenciais pelos adventistas. Os investigadores acabam encontrando um caixão de defunto, utilizado pelo pastor em palestras contra o tabagismo. Nesses cursos, o ministro costumava pedir aos fumantes que jogassem dentro do caixão seus maços de cigarro, numa atitude simbólica de trocar a morte pela vida. Mas alguém pergunta isso ao pastor? Não. E novos boatos surgem.

Lyndi é condenada à prisão perpétua com serviços forçados, tudo baseado em depoimentos contraditórios dos especialistas, e não havendo nenhuma prova conclusiva.

Em 1988, oito anos após o incidente, policiais encontram o casaquinho de Azaria, exatamente como Lyndi o descrevera, sendo assim inocentada. A frase final do pastor à imprensa resume todo o drama e sua solução: “Vocês não sabem o quanto vale a inocência para os inocentes.”

Michelson Borges é jornalista, redator da Casa Publicadora Brasileira e autor do livro Nos Bastidores da Mídia (www.cpb.com.br). Texto originalmente publicado no site do Curso de Jornalismo da UFSC.

quinta-feira, abril 20, 2006

Escolhendo bons filmes

Dicas para escolher filmes

Chega o sábado à noite e os amigos estão reunidos, pensando em alguma atividade recreativa. Até que alguém sugere: "Que tal assistirmos a um filme?" Os demais concordam com a idéia e vão até a locadora para escolher um DVD. E agora? O que alugar? Que critérios utilizar?

Esta seção do blog tem como objetivo justamente oferecer boas sugestões de filmes. As resenhas foram produzidas por profissionais de comunicação cristãos.

Mas antes de assistir qualquer produção, leia o texto a seguir, que foi extraído do capítulo 7 do livro Nos Bastidores da Mídia (www.cpb.com.br). Creio que estas dicas podem ajudar na escolha de filmes.

"A escolha de um filme para assistir não é simplesmente uma decisão do tipo “o que faremos hoje à noite?” Essa é uma escolha que causa impacto em nossa vida espiritual. Portanto, antes de alugar um vídeo ou assistir a um filme pela TV, leve em consideração os seguintes conselhos:

"1. Antes de avaliar um filme, conheça o máximo que puder sobre ele. Leia os resumos nos jornais e nas revistas. Lembre-se que 'a maioria dos filmes da TV é analisada pela imprensa. Naturalmente, essas revistas não são necessariamente feitas segundo a perspectiva cristã, e nem sempre os críticos são justos. Freqüentemente eles adotam uma atitude elitista para com o cinema popular. A despeito de tudo isso, as críticas oferecem perspectivas sobre o que a mídia está apresentando, e são uma fonte de esclarecimento ao espectador. Outra maneira de assistir aos filmes de uma perspectiva cristã positiva é discuti-los com outros depois do espetáculo, analisando particularmente seu sistema de valores. Essa prática ajuda a aperfeiçoar a capacidade de compreensão do filme, observando e comparando as perspectivas de outras pessoas que podem ampliar nossa própria opinião, chamando-nos a atenção a aspectos que antes nos escaparam à observação'. – Daniel Reynaud, Diálogo Universitário, 14:3 2002, pág. 17. Se for consultar alguém que já assistiu ao filme que você tem em vista, pergunte como os membros da família responderam ao filme. Eles compreenderam a mensagem? Ficaram com medo diante de alguns efeitos especiais? Foi necessário parar o filme e explicar alguma parte para as crianças?

"2. Avalie os princípios morais. O vídeo ensina atividades e comportamentos que desejo sentir e seguir? Esse critério ajuda a descartar filmes que enaltecem a violência, o adultério, o consumo de drogas e outros aspectos que se opõem aos princípios divinos. Lembre-se de que tudo o que você vê e ouve em um vídeo torna-se parte de você.

"3. Avalie a virtude. Os valores sexuais do vídeo estão em conformidade com os que aceito? Geralmente, os filmes retratam o sexo como uma aventura, raramente relacionado com o contexto do casamento. O conteúdo das mensagens sexuais é fácil de ser descoberto. Os resumos dos filmes podem nos orientar, assim como as pessoas que já os assistiram. Não é preciso (nem se deve) alugar um vídeo que faz com que a mãe tenha que sair correndo para interromper o filme.

"4. Avalie a qualidade. Qual é a qualidade da produção do vídeo. Muitos filmes são simplesmente maus produtos, criações que não valem o tempo de ninguém. Se os comentaristas de filmes debocham da qualidade, fique alerta. Seu lar merece algo melhor e sua mente não foi criada para receber lixo.

"5. Avalie a emoção. O filme me deixará com o humor saudável? Dick Duerksen, em artigo publicado na Adventist Review, de 16 de janeiro de 1997, lembra que Colossenses 3 descreve as mudanças de humor que ocorrem quando permitimos que Cristo elimine as más emoções e nos revista com os traços do caráter de Deus. Ira, rancor, malícia, lascívia, cobiça e mentira são substituídos por compaixão, bondade, humildade, perdão e amor. 'Uma vida centralizada em Cristo', escreve ele, 'é um poderoso substituto para o mau humor – o abandono daquilo que é destrutivo e a adoção do produtivo.' Comparar o conteúdo dos vídeos com os traços de caráter que você escolheu para modelar seu lar é uma das avaliações mais eficazes. Os vídeos devem reforçar as boas emoções que você escolheu, não mudá-las.

"6. Avalie a memória. Será agradável ter esse vídeo retido na mente? Todas as imagens dos filmes que você já assistiu estão armazenadas em uma porção recuperável de seu cérebro – um banco de informações ao qual você, Deus e Satanás têm acesso. Deus pode lembrá-lo dos segmentos que se enquadram em Seus propósitos. Mas Satanás também. E o inimigo muitas vezes usa essas memórias para atrapalhar-nos, no exato momento em que Deus nos tem no limiar de tomar uma boa decisão. Faça sempre de Filipenses 4:8 o critério para avaliar aquilo que deve ou não entrar em sua memória."